Em 1795, a colônia do Cabo foi tomada pelo Reino Unido, se
transformando em possessão britânica em 1814, por ocasião do Congresso de Viena. Após 1834, quando a
escravidão foi abolida em todo o Império Britânico, graves atritos começaram a
surgir entre os bôeres e os britânicos. Os bôeres se dirigiram ao norte do
atual território sul-africano, atravessando as montanhas Drakensberg e levando
consigo seus escravos negros. Na segunda metade do século XIX, fundaram as
repúblicas do Orange e do Transvaal, que nasceram do massacre dos povos nativos
e se constituiriam como sociedades fundadas na opressão racial.
O sistema colonial britânico em Cabo e Natal também adotava
práticas racistas que começaram a forjar as bases legais para o regime do
apartheid. Os britânicos introduziram a lei do passe no século XIX. Isto surgiu
a partir da regulamentação da circulação de pessoas negras das regiões tribais
para as áreas ocupadas por pessoas brancas e mestiças, governado pelos
britânicos. As leis não foram só criadas para restringir a circulação de
pessoas negras para essas áreas, mas também para proibir a sua circulação de um
bairro a outro sem o porte de um passe. Os negros não tinham permissão para
andar nas ruas das cidades das colônias do Cabo e de Natal de noite e eram
obrigados a portar seus passes sempre que estivessem em local público.Em 1892,
o voto dos negros foi limitado com base na educação e em recursos financeiros. Em
1905, os negros como um todo foram privados do direito de voto, além de terem
sua circulação limitada em áreas fixas.
No final do século XIX, a descoberta de jazidas de diamantes
e ouro nas repúblicas do Orange e do Transvaal provocou a guerra entre ingleses
e bôeres, que terminou com a rendição
das duas repúblicas. Em 1910, uma Constituição negociada entre bôeres e
ingleses criou a União Sul-Africana, incorporando os territórios britânicos do
Cabo e de Natal com as antigas áreas bôeres. Neste novo domínio britânico, todo
o controle político foi dado aos brancos, uma vez que o direito dos negros de
se sentarem no parlamento foi banido.Os bôeres logo fundaram o Partido Reunido
Nacional para disputar com os ingleses a hegemonia política da região. Sob a
bandeira deste partido, os africânderes (descendentes dos bôeres) começaram a
lutar pela oficialização das práticas de segregação racial.
Os africânderes chegaram ao poder em 1910 com a eleição do
primeiro-ministro Louis Botha, cujo governo adotou as primeiras leis de
segregação racial, tal como a proibição dos não-brancos de quebrarem um
contrato de trabalho e de se tornarem membros da Igreja Reformada Holandesa. Em
1913, todos os negros, com exceção dos moradores da província do Cabo, foram
impedidos de comprarem terras fora das "reservas indígenas". Ainda
naquele ano, a Lei de Terras Nativas dividiu a posse da terra na África do Sul
por grupos raciais. Os negros, que constituíam dois terços da população,
passaram a ter direito a apenas 7,5% das terras, enquanto os brancos, um quinto
da população, tinham direito a 92,5% das terras. As pessoas "de cor"
(mestiços) não tinham direito à posse da terra. A lei determinava ainda que os
negros só poderiam viver fora de suas terras quando fossem empregados dos
brancos.
Em 1918, o Projeto de Lei sobre Nativos em Áreas Urbanas foi
concebido para obrigar os negros a viverem em locais específicos. Entretanto, a
segregação urbana só foi introduzida no governo seguinte, de Jan Smuts, membro
do Partido Unido. Foi Smuts quem havia cunhado a palavra apartheid, em discurso
de 1917.
O Partido Reunido Nacional, o principal partido político do
nacionalismo africânder, venceu as eleições gerais de 1948 sob a liderança de
Daniel François Malan, clérigo da Igreja Reformada Holandesa. Uma das
principais promessas de campanha de Malan era aprofundar a legislação de
segregação racial. O Partido Reunido Nacional derrotou por pequena margem o
Partido Unido de Jan Smuts – que havia apoiado a noção vaga de lenta integração
racial – e formou um governo de coalizão com outro partido defensor do
nacionalismo africânder, o Partido Afrikaner. Malan instituiu o regime do
apartheid, e os dois partidos logo se fundiriam para formar o Partido Nacional.
A discriminação racial, há muito tempo uma realidade na
sociedade sul-africana, havia sido elevada à condição de filosofia. Uma
sociedade conhecida como Broederbond ("Irmandade") congregava os
"solucionadores de problemas" que elaboraram a doutrina do apartheid.
Tal doutrina foi definida da seguinte maneira no manifesto eleitoral do Partido
Nacional:
“A política da segregação racial se baseia nos princípios cristãos do que é justo e razoável. Seu objetivo é a manutenção e a proteção da população européia do país como uma raça branca pura e a manutenção e a proteção dos grupos raciais indígenas como comunidades separadas em suas próprias áreas (...) Ou seguimos o curso da igualdade, o que no final significará o suicídio da raça branca, ou tomamos o curso da segregação.”
Logo após a posse, o novo governo aprovou várias leis que
pavimentaram o caminho para o "grande apartheid", centrado em separar
as raças em grande escala, através da separação das pessoas em espaços para
cada raça. Entre os governos de Malan e Balthazar Johannes Vorster, o regime
nacionalista aprovou mais de 300 leis relativas ao apartheid.
A primeira grande legislação do apartheid foi a Lei de Registro
Populacional, de 1950, que formalizou a divisão racial através da introdução de
um cartão de identidade para todas as pessoas com idade superior a dezoito
anos, especificando a qual grupo racial cada uma delas pertencia. Equipes
oficiais ou conselhos foram criados para determinar a raça de indivíduos cuja
etnia não era claramente identificada. Tais casos trouxeram complicações,
especialmente para os mestiços, que em alguns casos tiveram membros de suas
famílias separados em raças distintas.
O segundo pilar do apartheid, a Lei de Áreas de Agrupamento,
veio em 1950. Até então, a maioria dos assentamentos continha pessoas de
diferentes raças vivendo lado a lado. Esta lei pôs fim a diversas áreas urbanas
e determinou onde cada um deveria viver de acordo com sua raça. A cada raça foi
atribuída uma área específica.
Em 1949, a Lei de Proibição dos Casamentos Mistos tornou ilegal
o casamento entre pessoas de raças diferentes. No ano seguinte, a Lei da
Imoralidade tornou crime relações sexuais entre pessoas de raças diferentes.
"Para uso de pessoas brancas Esses espaços públicos e todas as comodidades são reservadas para uso exclusivo de pessoas brancas" |
Em 1953, a Lei de Reserva dos Benefícios Sociais determinou
que locais públicos poderiam ser reservados para determinada raça, criando,
entre outras coisas, praias, ônibus, hospitais, escolas e universidades
segregados. Placas com os dizeres "apenas para brancos" tiveram seu
uso difundido em locais públicos, incluindo até mesmo bancos de praças. Sob a mesma
legislação, o governo se isentava da responsabilidade de oferecer serviços
públicos da mesma qualidade para todos os cidadãos. Aos negros eram fonecidos
serviços de qualidade muito inferior àqueles prestados aos brancos – e, em
menor medida, àqueles prestados aos indianos e mestiços. Em 1956, a
discriminação racial no local de trabalho foi formalizada.
Outras leis tinham como objetivo reprimir a resistência,
especialmente armada, ao regime de apartheid. Em 1950, a Lei de Supressão ao
Comunismo baniu o Partido Comunista Sul Africano e qualquer outra organização
política que o governo decidisse catalogar como sendo "comunista".
Qualquer manifestante contra o regime poderia ser tachado de
"comunista", se sujeitando a graves penas. Encontros não organizados
junto ao governo foram proibidos, assim como algumas organizações da sociedade
civil que foram encaradas como uma ameaça ao regime.
A educação foi segregada através da Lei de Educação Bantu de
1953, que criou um sistema educacional separado para os estudantes negros,
projetado para preparar os jovens negros para passarem o resto da vida como
trabalhadores braçais.Em 1959, foram criadas universidades específicas para
negros, mestiços e indianos. As universidades já existentes foram proibidas de
matricularem novos alunos negros. Em 1974, um decreto passou a exigir o uso do
africâner e do inglês em condições de igualdade em escolas de ensino médio fora
dos bantusões.
A Lei de Auto-Determinação dos Bantu de 1951 criou
estruturas governamentais separadas para cidadãos negros. A Lei de Promoção do
Auto-Governo Negro de 1958 deu suporte à política do Partido Nacional de criar
"pátrias" (em inglês: homelands) nominalmente independentes para o
povo negro. As chamadas "unidades autônomas Bantu" foram propostas.
Elas teriam poderes administrativos descentralizados, com a promessa de que
mais tarde iriam adquirir autonomia política e auto-governo. A Lei de Cidadania da Pátria Negra de 1970 marcou uma nova fase na
estratégia do regime de promover os bantustões. O governo mudou o status dos
negros que viviam na África do Sul para que deixassem de ser cidadãos
sul-africanos e se tornassem cidadãos de um dos dez territórios autônomos. O
objetivo do Partido Nacional era garantir que os brancos se tornassem maioria
na população sul-africana, incitando todos os dez bantustões a proclamar
"independência".
O contato interracial nos esportes era desaprovado, mas não
havia legislação segregando os esportes. O governo mantinha as práticas
esportivas segregadas utilizando outras legislações, como a Lei de Áreas de
Agrupamento.
O governo do Partido Nacional reforçou as leis de passe já
existentes, obrigando os negros sul-africanos a carregar documentos de
identificação a fim de evitar a migração de negros para a África do Sul
"branca".
As primeiras manifestações contra o apartheid foram
organizadas pelo Congresso Nacional Africano, partido político fundado em 1912
para defender os direitos dos negros, assim como por brancos de mentalidade
liberal. Na Campanha do Desafio, de 1952, os negros deliberadamente infringiram
a legislação racista, dando margem a detenções, na expectativa de congestionar
as prisões do país. No entanto, apenas 8.500 pessoas foram presas. Em 1960, o
então líder do CNA Albert Lutuli recebeu o Prêmio Nobel da Paz como chefe do
movimento de resistência pacífica ao regime de apartheid.
O protesto contra as Leis do Livre Trânsito, organizado pelo
Congresso Pan-Africano, acabou descambando na tragédia de Sharpeville em 21 de
março de 1960. Enquanto uma multidão de manifestantes negros avançava em
direção à delegacia de polícia local, os ânimos se acirraram e a polícia abriu
fogo, matando 69 manifestantes e ferindo 180. Todas as vítimas eram negras. A
maioria delas foi baleada nas costas.
O CNA considerou o massacre de Sharpeville um ponto
decisivo. Nelson Mandela, alegando que o movimento de resistência pacífica
falhara, afirmou que havia chegado o momento do CNA passar a adotar a
sabotagem. Na clandestinidade, criou o Umkhonto we Sizwe ("Lanceiro da
Nação"), ala militar do CNA. Apesar de suas unidades terem detonado bombas
nos edifícios do governo nos anos seguintes, o Umkhonto we Sizwe não ofereceu
ameaça real ao Estado sul-africano, que tinha o monopólio de armamento moderno.
O governo também endureceu sua posição. Desaprovado pela
opinião mundial e diante de um boicote econômico imposto pela Organização das
Nações Unidas, o regime baniu o CNA e o CPA, e se tornou uma república, se
desfiliando da Comunidade Britânica. À época, a África do Sul despertava a
hostilidade dos outros membros da Comunidade – particularmente aqueles na
África e Ásia, bem como o Canadá – devido ao seu regime de apartheid.
A Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a Resolução
1761 em 6 de novembro de 1962, condenando as práticas racistas do regime
sul-africano e pedindo que todos os países-membros da ONU cortassem as relações
militares e econômicas com a África do Sul. O boicote representava muito mais
uma inconveniência do que uma sanção de fato. Angola e Moçambique, ambas sob
domínio português, estavam prontas a rompê-lo, assim como Malauí, que dependia
bastante dos vínculos comerciais com a África do Sul. O petróleo, único recurso
mineral do qual a África do Sul não dispunha, podia ser obtido do Irã ou
sintetizado do carvão, por meio de processo inventado na Alemanha. Quando a
Grã-Bretanha se recusou a fornecer armas ao regime, a África do Sul criou sua
própria indústria bélica. Os recursos necessários ao investimento foram
proporcionados pela existência de um depósito de riquezas naturais, como
carvão, diamantes, cobre, platina e manganês, na África do Sul.
No final da década de 1960, as perspectivas para a população
não-branca da África do Sul eram desanimadoras. Mandela, considerado culpado de
traição em 1963, cumpria pena de prisão perpétua na Ilha Robben, ao largo da
Cidade do Cabo. Alerta e pronto para sufocar qualquer dissidência antes que se
tornasse grave, o regime criou o temido Bureau of State Security
("Escritório de Segurança Estatal"), órgão de repressão política
conhecido pelo acrônimo BOSS ("chefe").
Em 1974 o governo aprovou o Decreto de Mídia Afrikaans que
forçava todas as escolas a usarem o africâner quando ensinassem aos negros
matemática, ciências sociais, geografia e história nas escolas secundárias. Essa
política foi profundamente impopular. Em 30 de abril de 1976, crianças da
escola primária Orlando West no Soweto entraram em greve, recusando-se a ir às
aulas. A rebelião espalhou-se por outras escolas em Soweto. Os estudantes
organizaram um protesto em massa para 16 de Junho de 1976, que acabou com
violência - a polícia respondendo com balas às pedras jogadas pelas crianças. O
incidente disparou uma onda de violência generalizada por toda a África do Sul,
custando centenas de vidas.
Internacionalmente, a África do Sul ficou isolada. Inúmeras
conferências aconteceram e as resoluções das Nações Unidas foram aprovadas
condenando-a, incluindo a Conferência Mundial Contra o Racismo em 1978 e 1983.
Um imenso movimento de cerceamento de direitos iniciou-se, pressionando os
investidores a se recusarem a investir em empresas da África do Sul ou empresas
que fizessem negócios com a África do Sul. Os times esportivos da África do Sul
foram barrados de participarem de eventos internacionais, e o turismo e a
cultura sul-africanos foram boicotados.
Esses movimentos internacionais, combinados com problemas
internos, persuadiram o governo Sul-Africano que sua política de linha-dura era
indefensável e em 1984 algumas reformas foram introduzidas. Muitas das leis do
apartheid foram repelidas, e uma nova constituição foi introduzida que dava
representação limitada a certos não-brancos, apesar de não estendê-las à
maioria negra. A violência continuou até os anos 1980.
Os anos mais violentos dos anos 80 foram os de 1985 a 1988,
quando o governo P. W. Botha começou uma campanha para eliminar os opositores.
Por três anos a polícia e os soldados patrulharam as cidades sul-africanas em
veículos armados, destruindo campos pertencentes a negros e detendo, abusando e
matando centenas de negros. Rígidas leis de censura tentaram esconder os
eventos, banindo a mídia e os jornais.
Em 1989, F. W. de Klerk sucedeu a Botha como presidente. Em
2 de Fevereiro de 1990, na abertura do parlamento, de Klerk declarou que o
apartheid havia fracassado e que as proibições aos partidos políticos,
incluindo o ANC, seriam retiradas. Nelson Mandela foi libertado da prisão. De
Klerk seguiu abolindo todas as leis remanescentes que apoiavam o Apartheid.
Em 10 de Maio de 1994, Nelson Mandela fez o juramento como
presidente da África do Sul diante de uma eufórica multidão. Dentre suas
primeiras ações foi criada a Comissão Verdade e Reconciliação e reescrita a Constituição.
Na eleição multi-racial seguinte, o ANC de Mandela ganhou com margem larga,
efetivamente terminando com a era do apartheid.
Em 15 de Abril de 2003, o seu sucessor, presidente Thabo
Mbeki anunciou que o governo da África do Sul pagaria 660 milhões de Rand
(aproximadamente 85 milhões de dólares norte-americanos) para cerca de 22 mil
pessoas que haviam sido torturadas, detidas ou que haviam perdido familiares
por consequência do apartheid. A Comissão da Verdade e Reconciliação, formada
para investigar os abusos da era do apartheid, havia recomendado ao governo
pagar 3000 milhões de rands em compensação, pelos cinco anos seguintes.
FONTE: Wikipedia
Leia mais!
1 - Em que ano se iniciou o apartheid, e quais as reações da população local em relação a essa política segregacionista racial?
2 - Quais as principais características da política racial (apartheid)?
3 - Quais o principais fatores que influenciaram para o fim do apartheid?
2 - Quais as principais características da política racial (apartheid)?
3 - Quais o principais fatores que influenciaram para o fim do apartheid?